quinta-feira, 7 de abril de 2011

A auto-cura da violência

Fatos lamentáveis nos levam a crer que chegamos ao ápice da violência humana, mas não, acredite, ela ainda pode nos surpreender e chocar com grande frequência. Os fatos que cito são três em especial: primeiro uma luta de vale-tudo que ganha status de luta do século, segundo a vingança de um aluno estadunidense que sofreu bullyng na frente de uma câmera amadora, terceiro o massacre de um psicopata que dispara contra crianças dentro de uma escola. O que estes casos tem em comum? Por que sempre nos sensibilizam e nos atraem de forma tão singular? E por que, no entanto, se tornam tão banais e corriqueiros ao longo do tempo? Analisando fria e criticamente, lutadores, vingadores e psicopatas são o óbvio resultado de uma sociedade que só tem a capacidade de resolver a violência com a própria violência. E que, além de ser incapaz de resolvê-la de forma pacífica e inteligente, a anseia como diversão.


O primeiro fato que citei é a prova do que acabo de dizer, a luta que valeu o título mundial do UFC e que chamou a atenção de milhões de pessoas no mundo inteiro. O que desejavam tantas pessoas assistindo um combate assim? Nada mais do que a sofisticação da violência, o aperfeiçoamento da capacidade humana de se agredir, de se autodestruir. Uma luta que, é verdade, acabou decepcionando seus espectadores e telespectadores por ter sido rapidamente finalizada por um único golpe perfeito. É claro que todos queriam ver um conflito acirrado, aflitivo e que desse uma verdadeira lição de como arrebentar com um oponente.


O segundo fato contou com um instrumento virtual para ser divulgado e rodar o mundo inteiro, através do Youtube a vingança de um aluno que sofria perseguições na escola se tornou o mais acessado e compartilhado na rede. A violência escolar (que agora atende pelo nome estrangeiro:bullyng) é um fato comum em quase todas as instituições de ensino do mundo e que prejudica o aprendizado de muitas crianças e adolescentes. Como resolver? Não sabemos, mas uma vingança com grande violência pareceu um bom remédio. Não é atoa que o adolescente deste caso virou um verdadeiro “herói” em seu país, diga-se de passagem, a capital universal da violência gratuita.


O terceiro e mais atual caso é a ação de um psicopata, um delinquente desgovernado que propositadamente entra em uma escola e atira contra crianças em seu ambiente de estudo. O lugar que deveria ser o espaço da cidadania por excelência mais uma vez se torna no palco de um massacre sem nenhum tipo de justificativa possível. Mas até que ponto adianta nos debatermos de raiva? Na cidade maravilhosa onde a violência dos morros, causada historicamente pela violência da exclusão, que por sua vez remete a violência da escravidão e exploração e que hoje é combatida com a violência da polícia e do exército, o que significa mais um pouco de violência sem censura?


Já são tantas ações e reações violentas que já não podemos mais identificar os inocentes e os culpados. Eu sinceramente me sinto cúmplice de aberrações como essas, e talvez nós todos sejamos porque nos acostumamos com a violência diária e até esperamos dela a sua auto-cura. Vivemos a cultura da violência, uma cultura que se expressa, inclusive, no nosso desejo de ver o sangue rolar, de vingança e de justiça. É um sentimento de violência curativa, punitiva, vingativa e, no final das contas, quase divertida e satisfatória.